sexta-feira, março 31

Sapere aude !

Nem só de pão vive o homem…
Abraços e um ótimo fim de semana!


" Como vale a pena viver agora! Em vez da monótona labuta de procurar peixe junto aos barcos de pesca, temos uma razão para estar vivos! Podemos subtrair-nos à ignorância, podemos encontrar-nos como criaturas excelentes, inteligentes e hábeis. Podemos ser livres! Podemos aprender a voar ! "

Richard Bach, Fernão Capelo Gaivota



" Esclarecimento significa a saída do homem de sua minoridade, pela qual ele próprio é responsável. A minoridade é a incapacidade de se servir de seu próprio entendimento sem a tutela de um outro. É a si próprio que se deve atribuir essa minoridade, uma vez que ela não resulta da falta de entendimento, mas da falta de resolução e de coragem necessárias para utilizar seu entendimento sem a tutela de outro. Sapere Aude! 1 Tenha a coragem de te servir de teu próprio entendimento, tal é portanto a divisa do Esclarecimento. "

" Um homem pode, sem dúvida, no que diz respeito a sua pessoa, e mesmo então, somente por algum tempo, retardar o seu Esclarecimento; mas renunciar a ele, seja em caráter pessoal, e ainda mais para a seus descendentes, significa lesar os direitos sagrados da humanidade, e pisar-lhe em cima. "



Immanuel Kant, O que é o esclarecimento?

(1) "Ousa saber!" Horácio, Epistulae, livro 1, carta 2, verso 40.

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sexta-feira, março 24

Purificação

Que o dia termine bem.
Abraços,

" De fato, não é suficiente ter o espírito bom, o mais importante é aplicá-lo bem "

(..)

" As maiores almas são capazes dos maiores vícios como também das maiores virtudes, e aqueles que andam devagar podem avançar bem mais, se seguirem sempre pelo caminho reto, do que aqueles que correm dele e se afastam. "

Descartes, Discurso do Método

Purificação


Sê bom filho e bom pai, justo irmão, terno esposo.
Elege amigo teu o que, em virtude, prima;
Vive como ele vive e dele te aproxima.
Os conselhos lhe escutai; e, se te aconselhando
O teu amigo for um dia menos brando,
Perdão! Que sobre fiel vontade - Ó lei severa -
A fortuna fatal às vezes prepondera.
Dominar as paixões é dom que te pertence:
Tuas loucas paixões subjuga, doma e vence.
Sê casto, sóbrio e ativo. A cólera o semblante
Nunca te ensombre, nunca o mal te seja aceito.
Em público ou sozinho, e como a um semelhante,
A ti mesmo, tributa o devido respeito.
Na palavra e na ação, sê justo e sê prudente.
Vive, - mas, não te saia a morte da lembrança;
Nem te esqueça, jamais, de que o homem, facilmente,
Perde as honras e os bens que, facilmente, alcança.
Se os males que o destino acarreta, à porfia,
Nem podes mitigar, - Não blasfeme o teu lábio;
Suporta-os com prudência, e nos Deuses confia,
Que aos Deuses praz valer do que usa, como Sábio.
Adeptos, o erro os tem, como a verdade bela:
O sábio adverte, austero, ou aconselha, amigo:
Mas, se o erro vil domina, - ele recua e vela
Grava, no imo do peito as palavras que eu digo:
Não tenhas prevenção alguma: todavia,
Os atos, de outrem, pesa e a ti mesmo te guia;
Pois que, nem todos são exemplos e ensinamento.
Só do insensato é agir sem fim, razão nem tento.
Contempla, no presente, o futuro e o passado.
Faze, apenas, aquilo em que fores versado.
Instrui-te com vagar, aprende com paciência:
Do tempo e da constância é que vem a sapiência,
Poupa a saúde, que ela é um tesouro
precioso ao teu corpo: alimento; à tua alma: repouso.
Uma moderação, porque ainda mais nocivo
Do que a falta - resulta, às vezes, o excessivo.
Não pratiques o luxo e a avareza, também,
Pois só no meio termo é que consiste o bem.

Transcrito do livro "Os Grandes Iniciados - Pitágoras" de Édouard Schuré. (*) Estes versos são atribuídos a Lysis, discípulo de Pitágoras, e nos mostra todos seus ensinamentos e filosofia

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segunda-feira, março 20

Questões existenciais no tempo pós-moderno

Para quem ainda não foi consumido pelo vírus da pressa, tive o trabalho de compilar esse texto, muito bom por sinal, da revista Discutindo Filosofia, a qual, todos os direitos de reprodução devem ser reservados. A autora - Marta Vitória de Alencar - é professora de filosofia da escola de Aplicação da Faculdade de Educação da USP. Boa leitura!


Questões existenciais no tempo pós-moderno

Vivemos numa sociedade pós-moderna, “pra lá de moderna”. O tempo é curto, a vida é breve, os avanços tecnológicos se dão numa velocidade supersônica e tudo tem de ser muito prático, pois precisamos de tempo e condições para fruir a vida. Aliás, o modelo ideal de pessoa é a pragmática – aquela que sabe avaliar a utilidade de cada gesto, palavra ou expressão, pensamento, ação, e de cada coisa também. No entanto, essa mesma sociedade pós-moderna é produtora de milhares de coisas inúteis e efêmeras, que não nos levam a lugar algum ou pouco nos proporcionam. Acreditamos que consumir é a solução para nossa insatisfação e, no entanto, ao consumir, deparamos com o aumento desse desejo, que quer sempre mais e mais rápido.

Estamos diante de um paradoxo! Você sabe o que é isso? A filosofia explica. Opa! Mas não era Freud quem explicava tudo? Sim e por isso ele também era filósofo. Mas explicações servem para alguma coisa? Precisamos delas para viver? Será que eu preciso saber como e por que chegam à minha casa luz e água encanada, telefonia ou internet? Como e por que inventaram o automóvel e a televisão, e que diferença isso faz na minha vida? Será que preciso destas perguntas respondidas para viver e usufruir esses bens?

Sem incorrermos em erro, tranquilamente poderíamos afirmar que muitas pessoas nem sequer colocariam para si essas questões, mas questionariam somente se esses produtos têm ou não alguma utilidade. É fácil observarmos que, em nosso tempo, a maioria não está muito interessada em questionar algo que esteja para além da mera utilidade. Poderíamos até afirmar que não está muito disposta a ouvir explicações, pois elas são muito demoradas; ou que o problema não está nas explicações, mas no ouvir alguém que se apresenta como sumidade no assunto e coloca-se de forma pedante e autoritária, achando que temos tempo para ouvir algo que poderia ser dito de modo bem sucinto e que intimamente acredita poder chegar a compreender sozinho. É curioso observar que muitas vezes, quando não conseguimos compreender sozinhos ou não temos paciência para escutar a explicação do outro, rapidamente chegamos à conclusão de que o objeto em questão não serve para nada. Portanto, para que gastar tempo com explicações que não vão nos levar a lugar algum?

Mas, afinal, o que é que vai nos levar a algum lugar? As explicações, o saber ou os cacarecos inúteis e efêmeros produzidos e oferecidos incessantemente pela indústria pós-moderna? Quando adotamos a posição de imaginar que não queremos a transmissão de conhecimentos ou que somos auto-suficientes o bastante para chegarmos sozinhos aonde queremos, nos jogamos num buraco: a superficialidade e imediatez da vida pós-moderna nos levam a acreditar que os legados culturais podem ser dispensáveis, que os “como” e os “porquês” não tem muita utilidade. E mais: que podemos viver e usufruir os bens produzidos pela técnica e pela ciência sem entendê-las.

Que podemos gozar das produções artísticas sem fruí-las e transformar tudo em passatempo e entretenimento. Realmente podemos, mas, uma vez que essa perspectiva é adotada, tudo passa por nós como uma seqüência de imagens desconexas sobre as quais não podemos intervir. O tempo transforma-se em instantaneidade, o futuro torna-se uma imagem turva, e o passado uma imagem pálida. Passamos a tomar como máxima a idéia de que “devemos viver cada instante como se fosse o último”.

Existe uma razão para esse tipo de comportamento ser tão comum: vive entre nós a crença de “quanto mais, melhor”. Novamente aparecem os efeitos que a velocidade do desenvolvimento tecnológico imprime em nós. Para manter-se ativo, o capitalismo necessita do permanente consumo de mercadorias, e isto implica a idéia de que a renovação deve ser incessante e de que sempre está disponível algo novo que precisamos descobrir. Assim, produz-se o consumo frenético e compulsivo; quanto mais consumimos, mais desejosos de consumo nos tornamos. O problema dessa crença é que não questionamos a qualidade deste quanto, se ele é sempre o mesmo ou se é um mergulho, sempre mais profundo, um voltar-se para si mesmo, refletindo e indagando como e por quê.

sexta-feira, março 17

Nós, os pouco felizes

Caros,

Tenham um excelente fim de semana ...



"Este é o nosso mundo: O que é demais nunca é o bastante (...)"

Legião Urbana, Teatro dos Vampiros


" Examina os registros da história, relembra o que aconteceu no círculo de tua própria experiência, considera com atenção qual foi a conduta de quase todos os desgraçados, seja na vida pública, seja na pessoal, sobre quem possas ter lido, ou ouvido, ou de quem te lembres, e descobrirás que os infortúnios da grande maioria dessas pessoas se deveram a não saberem quando estavam bem, quando era adequado ficarem quietos e satisfeitos. "

Adam Smith, Teoria dos Sentimentos Morais

Nós, os pouco felizes
Ana Miranda


Nós, os seres humanos
que vivemos em casas ou apartamentos,
e não em acampamentos nem nos viadutos,
nem nas favelas ou nos hospícios,
nós que vivemos em residências de cujas janelas
podemos ver a cidade em seus ofícios e vícios,
ou as paisagens do campo e suas luzes,
nós que sabemos cantar em prosa e verso,
que podemos andar, sorrir, comer,
temos a indústria e o comércio,
e conta nos bancos, universitários,
que nunca fomos à guerra ou despejamos mísseis,
nós que podemos ver o mar, as ilhas,
as aves, as montanhas, o céu belíssimo,
as nuvens pretas, as estrelas,
a amplidão do mundo,
que temos mapas e a astronomia,
médicos e anestesia, hospitais e poesia,
que podemos viajar, olhar vitrines e comprar,
nós, ai, nós, que sabemos ler e lemos livros,
temos fogões em nossas casas,
temos camas, temos sexo e desejo, temos o beijo,
nós que ouvimos música no rádio ou em discos,
que temos filhos com todos os dentes,
escola, agasalho e nem vivemos em Cuba,
nós que não somos curdos,
nem etíopes nem angolanos,
que temos florestas imensas, rios, terras,
temos seca e temos chuva,
temos quadros e gravuras,
o luar do sertão e as araras,
que choramos no cinema,
que temos alma e lágrimas,
mil caras, uma só, dedos sensíveis e crenças,
amores secretos, jornalistas altruístas,
padres guerrilheiros, músicos ardentes, escritores,
sindicalistas, líderes sem-terra à vista,
violeiros repentistas, loucuras, alvará de soltura,
uma terra com palmeiras onde canta o sabiá,
que temos carro ou sapato sem furo,
temos o passado e o futuro,
nós que assinamos revistas e jornais,
temos casa de campo, mesmo que seja de um amigo
onde há cavalos e pirilampos,
nós que jantamos à luz de velas,
tomamos vinho e meio embriagados
lemos poemas para os passarinhos,
ou para as belas mulheres,
ou para o ser que amamos, e amamos vários,
nós que somo amados, que vamos à praia
ou não vamos mas esperamos a praia vir a nós,
que vestimos roupas e usamos um antigo anel de família
que ainda não foi roubado, e que talvez nunca seja,
que tomamos cerveja,
que temos a confissão e o perdão,
que acordamos tarde e não andamos de trem,
que temos salário, ou renda fixa,
emprego, família, paixão,
nós que temos corpo e estamos vivos,
temos amigos, temos trabalho, fazemos exercícios,
somos hedonistas, artistas, poucos,
nós que fazemos cinema,
que sentimos o perfume e temos sonhos,
que adoramos ouvir estórias
contadas por qualquer estranho,
que dançamos alegres com as crianças,
que gostamos de lareira e frio,
sorvete e calor, o limpo e o macio,
que sonhamos navegar tornando o mundo pequeno,
que usamos biquínis e tangas,
desfilamos nossos seios nus nas escolas de samba,
que não somos da ralé nem da choldra,
nem da rafaméia nem do lúmpem nem da miséria,
que especulamos e ganhamos mas também perdemos,
nós que temos raízes, diretrizes, teatro,
damas atrizes, jogadores, senadores,
ai de nós,
perdoai-nos,
somos os pouco felizes.


(*) Ana Miranda escreve contos, artigos para jornais ou revistas, pre-roteiros para cinema. Seu livro "Desmundo" foi adaptado para cinema, num longa-metragem dirigido por Alain Fresnot.

terça-feira, março 14

O que é Reificação?

Seres HUMANOS, sempre.
 
Abraço,


“Se o homem não aparece como alguém que age e

fala, reconhece o mundo, reflete e opina acerda dele,

deixou de aparecer como cidadão”



“A reificação configura-se como o processo pela qual, nas sociedades industriais, o valor (do que quer que seja: pessoas, relações inter-humanas, objetos, instituições) vem apresentar-se à consciência dos homens como valor sobretudo econômico, valor de troca: tudo passa a contar, primariamente, como mercadoria. (...) O trabalho reificado não aparece por suas qualidades, trabalho concreto, mas como trabalho abstrato, trabalho para ser vendido. A sociedade que vive à custa desse mecanismo produz e reproduz, perpetua e apresenta relações sociais como relações entre coisas. O homem fica apagado, é mantido à sombra. Todo o tempo, fica prejudicada a consciência de que a relação entre mercadorias (e a relação entre cargos) é, antes de tudo, uma relação que prevalece sobre a relação entre pessoas”

Fernando Braga da Costa
Da obra: Homens Invisíveis

 

sexta-feira, março 10

A tranquilidade do Deserto

Pessoal,
Estamos retornando das férias... tudo que é bom dura pouco (senão, deixa de ser bom)
Abraços e um grande fim de semana !


" Oh, quanto é especiosa a tranquilidade do deserto! Lá não há ódio, nem soberba; não há crueldades nem inveja: Estes monstros são feras invisíveis que habitam em nós, para serem ministros fatais de nossas discórdias, de nossas aflições; nascem da nossa sociedade, e se sustentam da nossa mesma comunicação: por isso a virtude costuma fugir ao tumulto, porque a nossa maldade não é pelo que toca cada um de nós, mas pelo que respeita aos outros: fomos perversos por comparação; e reciprocamente uns servimos de objeto às iniqüidades dos outros"


" Que são os homens mais que aparências de teatro? Tudo neles é representação que a vaidade guia: a fatal revolução do tempo, e o seu curso rápido, que coisa nenhuma pára, nem suspende, tudo arrasta e tudo leva consigo ao profundo da eternidade. Neste abismo, donde tudo entra e nada sai, se vão precipitar todos os sucessos e com eles todos os impérios."


"Quase tudo transcende à nossa compreensão, mas nada transcende à nossa vaidade…"

Mathias Aires, Reflexão sobre a vaidade dos homens

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