sábado, abril 18

O caos das quimeras

"A consciência é o caos das quimeras, das ambições, e das tentações;  a fornalha dos sonhos, o antro das idéias de que temos vergonha; é o pandemônio dos sofismas, campo de batalha das paixões. Experimente, em certas horas, penetrar através das faces lívidas de um ser humano que reflete, olhar em seu íntimo, observar sua alma e examinar sua escuridão. Ali, sob o aparente silêncio, há combate de gigantes, como em Homero, batalhas de dragões, e hidras e nuvens de fantasmas como em Milton, visões de espirais em Dante. Que coisa mais sombria é esse infinito que todo homem leva em si mesmo, pelo qual desesperadamente mede os desejos do seu cérebro e as ações de sua vida!" 

Victor Hugo, Os Miseráveis, Fantine, Livro sétimo

Sua quase semelhança com o merecimento engana muito os homens

"Ter êxito, eis o ensinamento destilado gota a gota pela corrupção que avança. Diga-se de passagem, não há nada mais odioso que o sucesso. Sua quase semelhança com o merecimento engana muito os homens. Para a multidão, êxito é o mesmo que superioridade. O sucesso, sósia do talento, tem um ingênuo que nele crê facilmente: a história. (...) Hoje em dia, uma filosofia quase oficial entrou em intimidade com a história, vestindo-lhe a libré  e fazendo-lhe o serviço de porteiro. Ser bem-sucedido: eis a teoria. Progresso supõe capacidade. Ganhar na loteria: eis o máximo da habilidade. Quem triunfa é bem quisto. Tudo está em nascer com uma boa estrela. Tenham sorte, o resto virá depois; sejam felizes, e o mundo tê-los-á como grandes. Fora cinco ou seis excessões notáveis que constituem o brilho de todo um século, a admiração contemporânea é simples miopia. O que é simplesmente dourado passa por ouro puro. Ser o primeiro a chegar não constitui honra, a não ser que se chegue a ser alguma coisa. É o vulgar e velho Narcizo adorando a própria imagem, aplaudindo a vulgaridade."

Victor Hugo, Os Miseráveis, Fantine, Livro primeiro

sexta-feira, abril 17

Caranguejos morais

“ Há almas que, a imitação dos caranguejos, andam para trás, sempre em direção às trevas, retrocedendo na vida à medida que esta avança, empregando a existência em aumentar a própria deformidade, sempre em novas venturas, impregnando-se mais e mais em sua crescente perversidade”

 

Victor Hugo, Os Miseráveis, Fantine, Livro Quarto