“ (…) O amor não é senão uma curiosidade mais ou menos viva, aliada à natural tendência que nos leva a cuidar da perpetuação da espécie. Com efeito, a mulher é como um livro, que bom ou mau, deve começar a agradar desde a capa. Se esta não for interessante, não inspira desejo de ser lido, e tal desejo está sempre na razão direta do interesse que ele nos inspira. A “capa”de uma mulher abrange-a de alto a baixo, como acontece no livro; e os seus pés, são-nos um atrativo semelhante ao que nos oferece a notícia sobre sua edição. (...) Do mesmo modo que os homens que leram muitos livros terminam por ler os novos, mesmo que maus, também, os que conheceram muitas mulheres, e todas belas, terminam curiosos também pelas feias, porque constituem para eles novidade. Podem os olhos ver o envoltório que lhes oculta a realidade, mas a paixão, transformada em vício, sugere-lhes qualquer razão favorável a falsa capa. Pode ser, dizem consigo mesmos, que a obra valha mais do que o título, e a realidade mais que o invólucro que a esconde. Tentam então percorrer o livro, que jamais fora folheado e encontram resistência; o livro vivo quer não apenas folheado, mas lido.”
Memórias de Casanova, Por ele mesmo.