Numa cidade qualquer, num dia qualquer de um tempo medido apenas cronologicamente, ele se levanta.Acorda para mais um dia e olha para seu cabide imaginário de personas pensando qual fantasia vestirá hoje.
Nesse mundo globalizado e sem fronteiras, ele acha melhor assim. Se "veste" conforme a ocasião, age como crê que gostariam que agisse e sobrevive sendo apenas mais um na multidão, não sendo notado, só mais um rosto indiscernível no meio de tantos iguais.
Ele já foi diferente, já sonhou e viu seus castelos de areia desaparecerem em marés cíclicas e incontroláveis, já lutou Quixotescamente com moinhos de vento e viu suas quimeras desaparecerem em Brumas.
Ele precisa sobreviver. Para isso abre mão de vivenciar suas idéias, seus pensamentos, suas convicções. O preço de ser diferente é muito alto e seu cacife se esgotou, ele agora é apenas um jogador passivo que não aposta mais nada e sequer blefa ...
Sonhos não alimentam o corpo e a alma ele já perdeu leiloada por migalhas há tempos. Que bom que existem suas personas ! Ele finge ser quem quiser e os outros acreditam (ou fingem que) num simbiótico e prático acordo. Para que arriscar ser real se tudo é de mentira ? Assim ele finge que é feliz e pode ser tudo que quiser, pode até querer ser feliz mesmo, num mosaico de fantasias e realidade entrelaçadas e confundidas. Nada é exatamente o que parece ser, mas também para que "ser" se o "estar", transitório e impermanente pode oscilar ao sabor da maré e trazer resultados mais práticos e bem menos dolorosos.
Hoje, ele definitivamente deixa de sonhar com um mundo diferente e seu último fragmento de alma, um literal fio de esperança, se solta desaparecendo para sempre.
Agora ele é irreversivelmente mais um da tribo dos sem-alma, vivendo em festas à fantasia com trajes previamente escolhidos pelos anfitriões de sua subsistência.
Hoje mais uma estrela se apagou e o mundo tornou-se ainda mais escuro
Leornado Andrade