segunda-feira, março 31

Quando no poente o dia se faz mudo

" Em mim tu podes ver a quadra fria
Em que as folhas, já poucas ou nenhumas,
Pendem do ramo trêmulo onde havia
Outrora ninhos e gorjeio e plumas.

Em mim contemplas essa luz que apaga
Quando no poente o dia se faz mudo
E pouco a pouco a negra noite o traga
Gêmea da morte, que cancela tudo.

Em mim tu sentes resplender o fogo
Que ardia sob as cinzas do passado
E num leito de morte expira logo
Do quanto que o nutriu ora esgotado.

Sabê-lo faz teu amor mais forte
Por quem em breve há de levar a morte."

Shakespeare, Sonetos

sexta-feira, março 28

LEISURE

What is this life if, full of care,
We have no time to stand and stare.

No time to stand beneath the boughs
And stare as long as sheep or cows.

No time to see, when woods we pass,
Where squirrels hide their nuts in grass.

No time to see, in broad daylight,
Streams full of stars, like skies at night.

No time to turn at Beauty's glance,
And watch her feet, how they can dance.

No time to wait till her mouth can
Enrich that smile her eyes began.

A poor life this if, full of care,
We have no time to stand and stare.


By Wm. Henry Davies.(Wm. Henry Davies (1871-1940) is to be considered as the poet of the tramps. Born at Newport, Wales in the UK, Davies came to America from Great Britain and lived the life of a vagabond. One day, as the result of jumping a train, he lost one of legs. Davies returned to England where he continued to live the life of a tramp and a pedlar. He wrote poetry (presumably he did right along) and, eventually, he determined to print his own book and did so with the little money he earned panhandling. A copy of this first work, A Soul's Destroyer, came into the hands of George Bernard Shaw; which, in turn, led to the popularization of the poet.

A VIDA É SEMPRE MORTAL

"A vida assemelha-se um pouco a enfermidade, à medida que proceda por crises e deslizes e tem seus altos e baixos cotidianos. À diferença das outras moléstias, A VIDA É SEMPRE MORTAL. Não admite tratamento. (...) A vida atual está contaminada até as raízes. O homem usurpou o lugar das árvores e dos animais, contaminou o ar, limitou o espaço livre. Mas o pior está por vir. O triste e altivo animal pode descobrir e pôr a seu serviço outras forças da natureza. Paira no ar uma ameaça deste gênero. Prevê uma grande riqueza...no número de homens. Cada metro quadrado será ocupado por ele. QUEM SE LIVRARÁ DA FALTA DE AR E DE ESPAÇO? Sufoco só de pensar nisso! Infelizmente não é tudo.

Qualquer esforço para restabelecer a saúde será vão. Esta só poderá pertencer ao animal que conhece apenas o progressso do seu organismo. Desde o momento que a andorinha compreendeu que para ela não havia outra vida possível senão emigrando, o músculo que move suas asas engrossou-se, tornando-se a parte mais considerável do seu corpo. A toupeira enterrou-se e todo o seu organismo se conformou a essa necessidade. O cavalo avolumou-se e seus pés se transformaram em cascos. Desconhecemos as transformações por que passam outros animais, mas elas certamente existiram e nunca lhes puseram em risco a saúde.

O homem, porém, este animal de óculos, ao contrário, inventa artefatos alheios a seu corpo, se há nobreza e valor em quem os inventa, quase sempre falta ao quem os usa. Os artefatos se compram, se vendem, se roubam, e o homem se torna cada vez mais astuto e fraco. Compreende-se mesmo que a astúcia cresça na proporção de sua fraqueza. Suas máquinas pareciam prolongamentos dos seus braço e só podiam ser eficazes em função de sua própria força, mas, hoje, o atefato já não guarda nenhuma relação com os membros. E é o artefato que cria a moléstia por abandonar a lei que foi criadora de tudo que há na Terra. A LEI DO MAIS FORTE DESAPARECEU E PERDEMOS A SELEÇÃO SALUTAR.

TALVEZ POR MEIO DE UMA CATÁSTROFE INAUDITA, PROVOCADA PELOS ARTEFATOS, HAVEREMOS DE RETORNAR A SAÚDE. Quando os gases venenosos já não bastarem, um homem feito como todos os outros, no segredo de uma câmara qualquer neste mundo, inventará um explosivo incomparável, diante do qual os explosivos de hoje serão considerados simples brincadeiras inócuas. E um outro homem, também feito da mesma forma que os outros, mas um pouco mais insano que os demais, roubará este explosivo e penetrará até o centro da Terra para pô-lo no ponto em que seu efeito possa ser o máximo. HAVERÁ UMA EXPLOSÃO ENORME QUE NINGUÉM OUVIRÁ, E A TERRA, RETORNANDO À SUA FORMA ORIGINAL NEBULOSA, ERRARÁ PELOS CÉUS, LIVRE DOS PARASITOS E DAS ENFERMIDADES"

Italo Svevo, Consciência de Zeno

A alegria de quem soube conquistar uma parte exuberante do festim

"A lei natural não dá direito a felicidade; ao contrário, prescreve miséria e sofrimento. Sempre que o alimento é exposto, acorrem parasitas de todas as partes e, se não em número suficiente, logo outros se apressam em nascer. Com pouco a presa mal é suficiente para eles, e logo em seguida já não lhes basta, pois a natureza não faz cálculos; procede por experiências. Quando o alimento começa a rarear, eis que os consumidores devem diminuir através da morte precedida pela dor; assim é que o equilíbirio, por um instante de restabelece. PARA QUE LAMENTAR-SE? No entanto, todos se lamentam. Os que nada tiveram da presa morrem gritando contra a injustiça e os que tiveram parte dela acham que deviam ter direito a muito mais. POR QUE NÃO MORREM E NÃO VIVEM EM SILÊNCIO? Por outro lado é simpática a alegria de quem soube conquistar uma parte exuberante do festim e se manisfeta em pleno sol entre os aplausos. O ÚNICO GRITO ADMISSÍVEL É DE QUEM TRIUNFA."

Italo Svevo, A Consciência de Zeno